Por Ruy Cavalcante

A palavra “narcisismo” é derivada da Mitologia Grega. Narciso era um jovem e belo rapaz (não, não era eu, rsrs) que rejeitou a ninfa Eco, que desesperadamente o desejava. Como punição, foi amaldiçoado de forma a apaixonar-se incontrolavelmente por sua própria imagem refletida na água. 

O narcisismo excessivo dificulta o individuo a ter uma vida satisfatória, é reconhecido como um estado patológico e recebe o nome de Transtorno de personalidade narcisista. Indivíduos com o transtorno julgam-se, dentre outros, grandiosos e absolutamente especiais. 

Posto isso, gostaria de falar um pouco da característica narcisista da igreja neoevangélica, que tem seus primeiros sintomas com o advento do pentecostalismo, mas que encontra seu auge totalmente estabelecido nas igrejas neopentecostais. 

É incrível como o consenso nessas igrejas é que somos de uma grandiosidade extrema. Expressões como “Eu profetizo”, “Eu declaro”, “Eu decreto”, “Eu ganho almas”, “Eu determino”, “minhas palavras (ou nossas palavras) tem poder”, e coisas afins, passaram a fazer parte do “Canon” evangélico, e são ditas com pompas de autoridade monárquica. 

O pior é que as igrejas históricas também começam a absorver tais procedimentos, pois é algo extremamente infectante. Passamos a acreditar de fato que temos tanto poder e grandiosidade assim. 

Nossas músicas cantam isso, nossos púlpitos anunciam isso, e em nossas orações esbravejamos palavras de ordem espirituais, como se pudéssemos de fato “trazer coisas a existência”, ou exigir alguma coisa dos anjos ou mesmo de Deus. 

A coisa fica ainda mais séria quando vemos lideres e irmãos anunciando maldições sobre a vida de outros, declarando derrotas na vida daqueles que discordam de suas afirmações, ou que questionam seus ensinamentos, sob a suposição de que possuem tal poder. Pior ainda por ser algo que se prolifera e, quando menos percebemos, também estamos ameaçando com maldições espirituais aqueles que não se encaixam em nosso padrão de convivência. Tudo isso fruto dessa síndrome narcisista que tem tomado conta de nossa vida, fazendo-nos acreditar que somos poderosos. 

Além disso, o desejo hoje parece ser o inverso do ensinado por Cristo, quando diz: 

Jesus os chamou e disse: "Vocês sabem que aqueles que são considerados governantes das nações as dominam, e as pessoas importantes exercem poder sobre elas. Não será assim entre vocês. Pelo contrário, quem quiser tornar-se importante entre vocês deverá ser servo; e quem quiser ser o primeiro deverá ser escravo de todos”. (Marcos 10:41-44

Hoje ensinam o contrário, ensinam que somos especiais, que o líder deve ser honrado até mesmo com suas finanças, que temos autoridade sobre a vida um do outro. É a velha história, manda quem pode, obedece quem tem juízo. E todos querem obedecer, não porque são humildes, mas por desejar um dia ser obedecidos igualmente, por outros irmãos novatos no processo. 

Tudo é um jogo de interesses, todos querem ser servidos, todos se acham especiais. Não se deseja mais ser o servo do irmão, mas o líder de sua vida. E a roda não para de girar, o escravo de hoje se submete a isso para ser honrado com a liderança de amanhã. 

Essas coisas são muito estranhas para mim, pois não encontro nada disso no evangelho. Por esse motivo também não entendo a relutância em abandonar esse tipo de conceito, em se submeter à verdade bíblica, aos exemplos e palavras de Cristo. 

Por hora gostaria apenas de declarar o seguinte: Eu não tenho autoridade, minhas palavras não têm poder e eu não preciso ser temido. Eu quero cantar canções que engrandeçam Deus e não a mim, eu quero pregar e ouvir o anúncio de palavras que valorizem Cristo e não o meu ego. Eu quero servir e não ser servido. 

E que Deus tenha misericórdia de mim todas as vezes que eu desejar o contrário disso, me fazendo retornar à minha sanidade espiritual.