Por Ruy Cavalcante

Como prometido, abordarei brevemente outro tema comumente mal interpretado nas escrituras, embora eu acredite que não se trata realmente de um erro de interpretação, mas de dissimulação por uma parte da liderança cristã.

Quantos já não ouviram, após um debate apologético, após uma crítica a um falso ensino, ou mesmo quando um irmão decide cursar teologia, a “celebre” frase: Irmão, cuidado, pois a letra mata!

Obviamente baseiam-se no seguinte texto bíblico:

Porque a letra mata, mas o espírito vivifica” (2 Co 3:6b)


Analisemos então esta passagem bíblica para identificarmos o verdadeiro sentido desta afirmação do apóstolo Paulo. Vale ressaltar que (quase) sempre minhas análises são feitas de forma bem simples, lógicas e diretas, justamente numa tentativa de demonstrar que a interpretação bíblica não é algo tão complexo quanto muitos tentam impor, basta atenção, compromisso com a verdade e novo nascimento, se é que me entendes.

Pois bem, observando todo o contexto dos capítulos 2 e 3 da segunda carta aos coríntios, podemos facilmente chegar a uma conclusão clara e simples, senão vejamos:

Graças, porém, a Deus que em Cristo sempre nos conduz em triunfo, e por meio de nós difunde em todo lugar o cheiro do seu conhecimento” (2 Co 2:14)

Porque nós não somos falsificadores da palavra de Deus, como tantos outros; mas é com sinceridade, é da parte de Deus e na presença do próprio Deus que, em Cristo, falamos” (2 Co 2:17)

Observe que no final do capitulo 2, Paulo cita, como um dos objetivo de suas viagens, o conhecimento da palavra, ou o anúncio desse conhecimento. Defende-se ainda, afirmando não falsificar a palavra de Deus, pelo contrário, fala a verdade, com sinceridade.

Isso nos dá pistas de que o conhecimento teológico, talvez, não seja o foco de sua afirmação do verso 6, no capitulo seguinte. Continuemos.

Sendo manifestos como carta de Cristo, ministrada por nós, e escrita, não com tinta, mas com o Espírito do Deus vivo, não em tábuas de pedra, mas em tábuas de carne do coração” (2 Co 3:3)

Aqui vemos uma afirmação interessante e, pelo menos para mim, bem clara. Paulo está tratando de uma grande diferença entre a antiga e a nova aliança. A antiga, escrita com tinta ou talhada em pedras, sem vida, diferente da nova, da qual Paulo é ministro, escrita no coração do ser humano, referencia a nova habitação de Deus, ao novo templo da nova aliança, eu e você, conforme já havia sido anunciado por Deus a Jeremias.

Eis que os dias vêm, diz o Senhor, em que farei um pacto novo com a casa de Israel e com a casa de Judá, não conforme o pacto que fiz com seus pais, (...) Mas este é o pacto que farei com a casa de Israel depois daqueles dias, diz o Senhor: Porei a minha lei no seu interior, e a escreverei no seu coração; e eu serei o seu Deus e eles serão o meu povo” (Jr 31:31-33)  / Ver também Hb 8:10.


Por fim, no versículo 6, onde encontramos a tão repetida (e batida) frase “a letra mata”, temos uma definição:

E é por Cristo que temos tal confiança em Deus; não que sejamos capazes, por nós, de pensar alguma coisa, como de nós mesmos; mas a nossa capacidade vem de Deus, o qual também nos capacitou para sermos ministros dum novo pacto, não da letra, mas do espírito; porque a letra mata, mas o espírito vivifica” (2 Co 3:4-6)

Claro como a neve não?

A letra a que Paulo se refere é exatamente a Lei, a antiga aliança feita com o povo de Israel, por meio de Moisés, aliança esta que, em conseqüência da condição do pecado humano, não tinha vida, mas gerava morte. Em contrapartida, a nova aliança com Deus, escrita nos corações não com tinta, mas com sangue, não com letras, mas com o Espírito Santo de Deus, essa gera vida.

Pois a lei nenhuma coisa aperfeiçoou, e desta sorte é introduzida uma melhor esperança, pela qual nos aproximamos de Deus” (Hb 7:19)


Porque a lei, tendo a sombra dos bens futuros, e não a imagem exata das coisas, não pode nunca, pelos mesmos sacrifícios que continuamente se oferecem de ano em ano, aperfeiçoar os que se chegam a Deus” (Hb 10:1)


Porém, existe algo que o estudo teológico e a busca por conhecimento mata: A ignorância, o engano e a chance de ser conduzido para qualquer um dos lados que os falsificadores do evangelho  desejarem (2 Co 2.17).

A escolha é sua, continuar sob o jugo de homens, ou ser liberto pela palavra. Para lhe incentivar, deixo o exemplo de Cristo, na esperança de ser este um assunto onde haja unanimidade entre nós cristãos: Jesus é nosso grande exemplo, imitando-o estaremos bem.

Chegando a Nazaré, onde fora criado; entrou na sinagoga no dia de sábado, segundo o seu costume, e levantou-se para ler” (Lc 4:16)

Só para lembrar, o costume era ir à sinagoga para estudar a palavra de Deus.